2009-10-26

Última estação, todos devem desembarcar...

Eu também vi coisas que vocês não acreditariam.
Vi a bondade e a maldade no coração das pessoas.
O sacrifício totalmente altruísta e a mais egoísta das vaidades, na mesma pessoa.
Vi a inveja e o despeito no meu próprio coração. A verdade, a mentira.
Congelei de medo, e saltei no espaço com toda a coragem, tudo num só dia.
Todos esses momentos serão, um dia, como lágrimas na chuva.
As trinta vezes que eu assisti ao meu filme preferido, nada serão.
As paixões que eu senti, as dores infinitas no meu peito, os meus gritos e uivos sufocados... nem em sussurros se transformarão.
Meus amores correspondidos, meus amores não correspondidos, meus amores decepcionados, nada!
Somente as sementes que plantei darão conta de que eu existi.
Os valores que ensinei aos meus filhos, os exemplos que dei aos meus pares, a vida que vivi.
Inexistindo, ainda assim permanecerá.
Nas lágrimas de quem me amou, no riso de quem me odiou, na ignorância de quem me ignorou, viverei para sempre, ou até a próxima chuva.
A minha imperfeição, dominando o universo do futuro, carregada por anos-luz em rápidas naves em direção ao infinito. Meus genes, meus memes. E quando o Sol estiver apagado e o próprio Universo expirar em seu morno e uniforme leito final de entropia, e tudo for tudo e nada, espero que um ínfimo dessa imperfeição esteja lá. Um fóton faltante, um pixel morto, negro, na imensidão branca. Destiny, destination.

2009-10-06

Eu já soube declamar isso de cor (na sexta série):

Meu Sonoro Passarinho

Meu sonoro passarinho,
se sabes do meu tormento,
e buscas dar-me, cantando,
um doce contentamento,

Ah! não cantes mais, não cantes,
se me queres ser propício;
eu te dou em que me faças
muito maior benefício:

Ergue o corpo, os ares rompe,
procura o porto da Estrela,
sobe à serra e, se cansares,
descansa num tronco dela.

Toma de Minas a estrada,
na Igreja Nova, que fica
ao direito lado, e segue
sempre firme a Vila-Rica.

Entra nesta grande terra,
passa uma formosa ponte,
passa a segunda; a terceira
tem um palácio defronte,

Ele tem ao pé da porta
uma rasgada janela:
é da sala, aonde assiste
a minha Marilia bela.

Para bem a conheceres,
eu te dou os sinais todos
do seu gesto, do seu talhe,
das suas feições e modos.

O seu semblante é redondo,
sobrancelhas arqueadas,
negros e finos cabelos,
carnes de neve formadas.

A boca risonha e breve,
suas faces cor-de-rosa,
numa palavra, a que vires
entre todas mais formosa.

Chega então ao seu ouvido,
dize que sou quem te mando,
que vivo nesta masmorra,
mas sem alívio penando.

(Tomás Antônio Gonzaga)